segunda-feira, 7 de abril de 2014

Deixei meu coração, sem querer

Deve estar sendo difícil pra você, pode ser que sim. Não está sendo nada fácil para mim também... Faz tempos não me esqueço assim de mim por tanto tempo. E o que é o "esquecer-se", é simplesmente perder-se. Perdi-me, quando deixei meu coração sem querer.


quinta-feira, 12 de julho de 2012

Ti amo troppo

"Mais uma de amor..." pensava ela ao abrir sem êxito a carta que tanto viajara antes de chegar em suas mãos. Viera de longe só para lhe dizer o que já sabia, mas que não parecia fazer diferença alguma. O brilho nos olhos parecia estar cada vez mais se apagando e a beleza das coisas parecia estar se perdendo. Os detalhes já não eram mais tão mágicos e o seu sorriso tão pouco espontâneo. Sentia-se distante e certas coisas não mais pareciam fazer sentido...

Ela desaprendeu certas lições essenciais da vida, como a verdade sobre a distância e a profundidade do amor. Aos poucos foi se perdendo nos encantos materiais do mundo, até parar de notar a delicadeza das coisas simples do dia a dia, que verdadeiramente embelezam a vida e trazem a felicidade como retorno imediato. Aquela carta falava por si só, tinha brilho próprio. Continham palavras simples, mas ainda assim sinceras, cujo significado só ela e o remetente sabiam.

Aquela carta... Não ousaria deixar de responder, só pra manter viva a memória do que ela fora, do que uma vez sentira... E ali, somente naquelas palavras escritas, viveria.

sábado, 8 de outubro de 2011

Prazer em te ver, estranho

Foi tudo um sonho. Não o vi direito, não o conhecia. Fechei os olhos novamente e quase que por um segundo ele estava lá, mas perdia-se em meio a outras imagens e a escuridão de fundo. Ele me dizia algo, mas não falava, as palavras surgiam em meus pensamentos. Afirmou que há coisas que devem ser vistas, e outras não. Pegou minha mão e perguntou se poderia vir comigo, e eu, que não sabia aonde estava indo, disse que sim. Ele acabou por se tornar o meu caminho, minha direção. Seguiriamos juntos iluminando a escuridão, ainda que sequer enxergasse a claridade.

Até abrir os olhos. Foi tudo um sonho...



domingo, 18 de setembro de 2011

Uma flor para outra flor

Entrou cabisbaixo no trem. Não me viu nem nada, nem sequer olhou a sua volta. Parecia triste também, mas ainda assim transparecia uma certa segurança que sempre teve dentro de si. Uma certeza tamanha que transborda razão e todas as situações sob controle, até mesmo o fracasso. O contrário de mim. Na verdade, não sabia se o que aconteceu foi de fato um fracasso, mas conforme eu tentava entender os acontecimentos que sucederam nossa chegada quase que simultânea ao trem, começava a questionar certas coisas.

Há alguns dias recebi uma proposta praticamente irrecusável de um estágio. Ligaram-me, liguei de volta, e marcaram a entrevista para aquele dia. Eu, que não sabia ao certo se queria ou não, decidi tentar, tendo em vista que já havia um bom tempo desde que me esqueci o que realmente quero ou não. E assim fui.

Prédio grande, importante, localizado numa rua séria do centro da cidade e abrigo para inúmeras pessoas igualmente importantes que iam e vinham, subiam e desciam, feito um ciclo sem fim. E eu vim. E subi. Cheguei à recepção, vi a sala de espera e aqueles que esperavam e, de um ato de covardia mas muita coragem, decidi ir embora, descer dali mesmo. Decidi de repente que não queria ter de esperar por aquilo e, como se quase corresse, deixei aquele prédio, entrei no trem, e até então não havia descoberto pelo quê espero. Ou ao menos pelo quê quero ter de esperar.

Foi quando ele entrou no trem, logo em seguida. Amigo de infância, vizinho, quando pequenos costumávamos brincar descalços na rua. Bairro pacato, pequeno, vivíamos longe do mundo moderno e complicado o qual nos deparamos assim tão de repente, e quando nos deparamos, perdemo-nos, distanciamo-nos um do outro. Por fim, disse-me uma vez que tinha de ser o melhor de todos, e eu achava isso um absurdo. Minha mãe me ensinou que entre ser uma boa pessoa e ser a melhor, eu deveria escolher ser uma boa pessoa, só que eu é que interpretei que um fator exclui o outro, e acabei por isso não acompanhando a evolução da minha rua, da cidade, do mundo... Desconfiava disso, desconfiava também que eu talvez não tivesse adquirido preparo para lidar com essa mudança. Perguntava-me ainda se aquele meu amigo de infância, sentado com ar de desânimo logo adiante, era o melhor de todos ali naquele vagão. E comparado com o quê ou com quem ele era o melhor?

Só me questionava daquele jeito para disfarçar um certo sentimento diferente que começava a se formar dentro de mim, um sentimento meio amargo, corrosivo. Se aquele era o peso do fracasso, então eu o estava sentindo. Queria somente ir pra casa, mas ao mesmo tempo não queria ter de chegar em casa. Chegar em casa significava ter de encarar tudo aquilo, ter de lidar com o que eu estava sentindo e ter de explicar-me a mim, ou a minha mãe.

Desci do trem meio atordoada, mas um pouco contente por estar voltando. Meu amigo logo se misturou a multidão de rostos estranhos passageiros dos trens e de uma rua qualquer. E eu marcahava de volta pra casa, como quem volta da guerra.

Virei a esquina da rua em direção a minha casa e quase não percebi que o chão que pisava estava coberto de flores brancas recém caídas das árvores. Aquela rua que a pouco havia se tornado tão séria e urbana foi a mesma rua a qual brinquei quando pequena, a calçada que pisei descalça e as árvores que corri em volta. E as mesmas flores que caíam setembros atrás. Como pude me esquecer das flores? Como pode tudo haver mudado assim tão depressa, sem que eu nem sequer tenha percebido? De um jeito ou de outro, declarei que não mais me esqueceria de muita coisa importante. E levei uma flor do chão pra casa, pra me lembrar disso naquele dia.

domingo, 14 de agosto de 2011

Te encontro daqui a 15 anos

De uma cidade de 6 milhões de habitantes, passageiros das ruas e das ruas da vida, quais são as chances de haver encontros ao acaso ao menos uma vez por dia? E entre duas pessoas ao prazo de 15 anos? Esta história não é sobre encontros em si, com falas perfeitas, românticas e finais felizes para sempre. Esta é uma história sobre desencontros da vida, os quais todos aqueles que acreditam ou não no acaso estão expostos a viverem.

Ela esperava por ele dessa vez. O celular em cima da mesa não ousava pronunciar-se, limitava-se apenas a indicar a hora e denunciar o atraso daquele pela qual ela esperava. Estava atrasado, mas nem sempre esteve. Viram-se pela última vez 1 dia atrás quando encontraram-se ao acaso no centro da cidade. Ele a viu passar e quase não acreditando, chamou-a pelo nome. Ela se virou, reconheceu-o e sorriu de volta, como se misturasse surpresa à suave alegria por rever um rosto antigo e familiar naquela cidade.

Conversaram por pouco tempo, seus empregos, o clima do Sul, o tio dela, o recém falecido avô dele... Ele recomendou uma boa livraria ali perto e ela quis dizer milhões de coisas que nem sabia ao certo, porém nada disse, deixou pra dizer no dia seguinte talvez. Combinaram de almoçar juntos no dia seguinte num bom restaurante sugerido por ele, afim de conversarem melhor. Ele anotou o número dela e despediram-se baixo a promessa de um telefonema. Ela apenas sorriu um sorriso nostálgico que o trouxe de volta aos seus 20 anos de idade e uma vida inteira pela frente.

Conheceram-se ainda bem jovens, ela havia acabado de terminar os estudos escolares e em breve completaria a maioridade. Estava hospedada na casa de seu tio no Rio de Janeiro, onde passaria as férias e festas de final de ano, antes de voltar pro Sul e iniciar uma nova etapa em sua vida, com carreira e faculdade garantidas; carro, bons amigos e pais cuidadosos. Já haviam concordado sobre seu ingresso na profissão da família, estudaria Direito e teria assim, todo um respaldo para tornar-se no futuro uma profissional altamente bem sucedida. Já tinha desde cedo toda sua vida traçada e não se incomodava muito com isso. Nunca foi de reclamar de nada que lhe era imposto e sempre aceitava tudo com um sorriso no rosto, guardando dentro de si seus sonhos mais profundos, inclusive o de encontrar alguém com quem compartilhar tudo isso. Mal sabia ela que este encontro estava prestes a acontecer.

Ele, ao contrário dela, sempre teve de correr atrás do que quisesse sozinho, pois raramente obtinha a direção ou a ajuda dos pais, que mesmo perto viviam sempre muito distantes. Fora criado pelo avô, um homem sábio que lhe ensinou sobre o amor e outras coisas da vida. Foi também o responsável por iniciar o neto na carreira bancária, onde teve chances de crescer e tornar-se um excelente profissional da área, cujos 15 corridos minutos de horário de almoço foram abençoados 1 dia atrás.

A primeira vez que se encontraram não foi ao acaso, tampouco especial. Foram apresentados numa das muitas festas cariocas as quais o tio da moça e o avô do moço frequentavam. Velhos amigos de boemia, tiveram de apresentar aquela bela moça ao jovem rapaz, que ficou encantado ao conhecê-la. Ela, sempre muito recatada, demonstrava de seu jeito delicado a admiração que sentia por ele, soltando por vezes uma risada tímida ao conversarem. E conversaram toda festa como se pudessem conversar toda vida. Parecia que já se conheciam há décadas e tinham tanto em comum. Ambos sonhavam em viajar um dia pelo mundo, ela de mochilão e ele de veleiro. "Eu posso te dar uma carona no meu barco", brincava ele enquanto recebia um "sim" de aprovação. Sentiam que iriam longe e sabiam que um dia ainda haveriam de se encontrar mundo afora, seja num país minúsculo da Europa, ou numa península da América Central. O que importava era se encontrarem, pois queriam isso; quanto mais se conheciam mais queriam se encontrar. Tanto queriam que decidiram antecipar esses encontros mundo afora para amanhã a tarde. E depois de amanhã. E depois, e depois. E assim o fizeram.

Passearam pela cidade e pelas nuvens. Cozinharam, jogaram baralho, assistiram tv, deitaram no gramado para ver estrelas, entraram no mar e escreveram seus nomes na areia. Cada dia era único e especial e cada vez mais tornavam-se mais próximos. Aos poucos, um sentimento entre os dois ia crescendo. Estavam felizes juntos e assim queriam estar todos os dias.

Nesse meio tempo, o Natal já vinha sendo anunciado. Ela porém, não queria presentes, queria apenas apresentar o rapaz aos pais à espera de aceitação e apoio. Mas era de se esperar que isso não iria acontecer, que eles não levariam o relacionamento dos dois tão bem quanto o tio. Sua mãe logo notou o curso dos acontecimentos e os reais sentimentos da filha por ele. Alertou-a e aconselhou a filha a não se "apegar" demais, pois em breve as férias terminariam e ela teria de voltar pra casa, pondo fim ao relacionamento. Ela no entanto, não entendia a mãe, e considerava sua preocupação em vão. Talvez soubesse que uma hora ou outra teria de encarar os fatos, mas no final acabou por entender tudo naquela virada de ano, quando abraçada a ele na praia, em meio aos fogos de artifício, sentiu um profundo medo de perdê-lo. Ali, onde os fogos explodiam quase que em câmera lenta no reflexo daqueles olhos fixantes, abraçou-o ainda mais e quis nunca mais dele se separar. Diversos sons misturavam-se em sua mente, com gritos de felicidade, lembranças de uma virada de ano marcante da infância, calor, a voz de sua mãe dizendo que ele a considerava somente um amor verão. Um amor de verão. E se ela estiver certa? Naquela mistura de sensações, teve apenas uma certeza: seus sentimentos por ele eram fortes e tendiam a crescer cada vez mais, mas questionava-se se era recíproco; e se fosse, seria certo deixar isso acontecer? Queostinava-se se seria certo pros dois.

"Feliz ano novo, meu amor! Quero passar com você muitos e muitos outros anos!" Ele respondeu quase que imediatamente quebrando a tensão momentânea. Os dois tinham a mesma vontade, passar muitas e muitas outras viradas juntos, mas a partir de agora questionando-se: "como?"

Os dias que se sucederam começaram a degradar a imagem de perfeição dos dias que até então haviam passado juntos. Os passeios pela cidade, os lugares, tudo o que faziam parecia perder o encanto. Ele percebia que ela, apesar de feliz ao seu lado, não estava bem, parecia inquieta todo tempo. Uma hora ou outra haveria de ter Aquela conversa a qual ela tanto ansiava, mas tanto tinha medo. Até que um dia soltou no ar: "O que vai ser de nós?". Ele entendeu bem a pergunta, disse que já esperava que sua inquietação fosse referente a isso e que sinceramente não queria que ela fosse embora. Mas ela tinha de ir! Desde o começo tinha e ele sabia disso. Ela queria, no fundo, soluções imediatas, mas que não atrapalhassem seu mais novo futuro super estável. E para ele, a maneira de ficarem juntos estava bem clara: ela ficando no Rio. Queriam ficar juntos, isso era certo, mas talvez não quisessem abrir mão só um pouquinho de suas próprias vidas em prol da vida dos dois. E era tão jovens e inexperientes para enxergar a relação a longo prazo...

Abraçaram-se intensamente naquele momento como se soubessem que aquele abraço era o começo das despedidas. E realmente era. Os próximos dias tiveram um tom quase tão fúnebre quanto uma real morte. "Não fiquem tristes, vocês poderão se ver nas férias". É claro, tio! Ela poderia esperar todo ano pelas férias para vê-lo, como forma de temporariamente estarem juntos, mas parecia que ele não poderia. Revoltava-se contra a calma e a conformidade da moça perante aquela situação. Sempre foi muito exato e radical, se não pudesse alcançar o que quisesse de imediato, não descansava até o conseguir, e o que mais fazia era descabelar-se tentando convencê-la de de que sua visão era a mais correta para a solução de seus problemas. Não suportaria ter de vê-la partir e depois disso se encontrarem apenas 2 ou 3 vezes ao ano. Mas ela não entendia a sua revolta e se entristecia ao vê-lo nesse estado. As possibilidade começaram então a ficar de lado. Pareciam cansados de buscar respostas e soluções que são sempre frustradas no final. Ele começou a não querer vê-la, faltando poucos dias para o seu retorno ao sul. Ela sofria por ter de passar por isso e chorava a cada telefonema não atendido, não entendendo porque a ignorava. "Se é assim, então eu vou voltar para casa mesmo e esquecer de tudo o que aconteceu aqui", e assim o faria. Parcialmente.

No dia da grande viagem de regresso, ele surgiu na casa a qual a menina estava hospedada pedindo para conversarem. Ela, surpresa e muito magoada por haver sido ignorada nos últimos dias, decidiu ouvir seu grande amor quase que perdido e suas palavras não poderiam ter sido mais belas, e portanto, mais fatais possíveis: "Eu amo você. Eu preciso de você pra ser feliz. Não queria suportar a ideia de te ver indo embora, por isso não atendi seus telefonemas, para tentar me acostumar com a ideia de viver sem você aqui. Mas não consegui. Eu sei que eu não sou o melhor cara do mundo pra você, mas se você decidir não viajar hoje e ficar comigo, você será a mulher mais amada do mundo, e eu tenho certeza que nós daremos um jeito de viver bem aqui. E se você quiser, eu falo com seus pais, só por favor não vá embora hoje, e me dê uma chance para ficarmos juntos de verdade". Foi o que ele disse. Ou algo do tipo. Já não lembrava exatamente das palavras; e ali, naquela mesa de restaurante à espera dele, com todas aquelas memórias vindo à tona contrastando com a vida que teve, tinha uma forte tendência a romantizar tudo. Acontece que o suceder da história não foi nada romântico, voltou pro sul naquela noite feito uma fugitiva de guerra em busca de abrigo e segurança, estudou Direito como sua família quis, viajou algumas vezes ao exterior graças a algum pacote turístico de internet, conheceu seu marido devidamente escolhido pelos pais, casou-se como manda o figurino, trabalhou, trabalhou, até que um belo dia teve de ir ao Rio a trabalho, quando esbarrou ao acaso com o homem o qual dividiu os melhores dias de sua vida e o qual havia perdido sem nem sequer dar uma explicação.

Esperava por ele naquela mesa de restaurante, porém, não mais para almoçar, mas para dizer um sincero: "Me desculpe". Me desculpe por ter sido fraca e medrosa por nem sequer ter enfrentado minha família para impor minha vontade de ficar. Me desculpe por simplesmente ter seguido o curso natural da minha vida tão pré definido. Me desculpe por nunca mais ter voltado nas férias, por ter me casado com um homem o qual eu tive de me "acostumar" com o tempo, por ter feito planos de vida e viagens com ele.  Me desculpe por nunca ter dito o que eu sentia por você. Me desculpe por não ter ficado, e principalmente, me desculpe por não haver ligado, ao menos para confirmar que iria embora, mas que nunca te esqueceria. Ma agora já está tão tarde...

O mesmo telefone que nunca tocou na casa dele, também não tocou na mesa do restaurante. Não tinha seu número, e mesmo que o tivesse não saberia se ousaria ligar. Quis tanto que o destino os fizessem se encontrar novamente, mas tinha medo exatamente disso: de ter dúvidas. Sempre tentou evitar seu sofrimento, mas no final não serviu de nada. Engoliu novamente todas as desculpas e desabafos que  por tanto tempo estiveram aprisionados em sua garganta e deixou o restaurante. Nunca saberia o porquê de ele não ter ido, assim como ele nunca soube nem saberia o porquê de muita coisa. A eles, só lhes resta agora esperar que o universo os presenteie com mais um encontro, ou desencontros da vida...

"Te vejo daqui a 15 anos", sussurrava ao sair do restaurante, o mesmo sussurro,  que proferiu no avião anos atrás quando decolava rumo ao sul.


sábado, 30 de julho de 2011

Mariana foi pro mar

Uma tarde fria, um céu cinza e um oceano inteiro de cenário. A praia vazia e úmida servia de abrigo para aquela pobre alma quase que jogada à areia, totalmente aos prantos. Trajava algo incomum para aquela ocasião, vestido branco bordado em pedras brilhantes, véu e grinalda; mais parecia haver recém saído do altar ao som de sinos e de promessas de felicidade eterna, do que qualquer outra coisa. Apesar de parecer uma noiva, não parecia estar feliz. Na verdade nem sequer era uma noiva. Enquanto remoía os fatos que sucederam sua chegada ao mar, chorava lágrimas de angústia, que misturavam-se à areia borrando sua maquiagem e apagando qualquer esperança de que poderia ser feliz novamente.

Casou-se há menos de 2 semanas com aquele que foi considerado o "homem de sua vida", e desde então parecia estar vivendo dias incríveis ao seu lado. Fez planos, construiu todos os seus sonhos em cima dos sonhos dele e estava pronta para abdicar de toda individualidade em prol da vida de casal. Sentia que sua bela história de amor começaria merecidamente a ser escrita, pondo fim a todos os seus dias de solidão e espera. Achava que felicidade maior não caberia em si daqueles dias em diante, e ao lembrar de tudo isso ali na areia, esforçava-se por pensar em todos os motivos possíveis que fizeram seu marido ir embora. Assim, do nada! Sem nem avisar nem se explicar, sem nem sequer preparar com antecedência seu frágil coração de moça pura. Acreditou nele, confiou todo seu amor e foi traída. Seu coração foi partido em mil pedaços, e como se não bastasse estar profundamente ferida interiormente, não possuía bem algum sequer. Todo o dinheiro que havia juntado faz tempos foi investido em seu casamento perfeito e ilusório, materializado em uma conta conjunta a qual foi varrida até o último centavo pelo marido ao partir. E ela, que já nem sequer iria querer mais nada dele mesmo, quis apenas ir pro mar, como último desejo talvez. Vestiu-se de noiva porque não queria ter de sofrer, ainda que nem por um instante conseguisse evitar. Foi pro mar porque a fazia recordar bons momentos do passado, quando ainda muito jovem passava horas sentada na praia imaginando como seria seu futuro ainda muito distante. Mal sabia ela naqueles tempos, que o mesmo mar que costumava fazê-la sentir esperança seria o mesmo que acabaria com o seu sofrimento no futuro. É isso. Ali, mirando o mar, teve a ideia de acabar com o seu sofrimento, mas da maneira mais fácil, porém mais covarde possível: tirando-lhe a própria vida lançando-se às águas como uma própria oferenda a tudo o que representa a imensidão e a tornava feito mais um grão de areia na praia. Estava fadada a esse destino, e já nem mais queria pensar nos porquês ou razões, queria apenas seu consolo fazendo parte do mar. E assim faria.

Alguns raios de sol alternavam-se entre a sombra das nuvens e iluminavam a praia, ela se ergueu na areia e fixamento olhando o mar, caminhou lentamente até ele. O vento mais parecia querer dançar, balançava seu longo e belo vestido branco, seus cabelos e seu véu, numa harmonia quase que perfeita. Sentindo o vento frio, tocou pela primeira vez a água do mar com a ponta dos pés, como se fossem os primeiros passos do fim oficial de seu casamento. Parecia tão decidida, como sempre fora em toda sua vida, mas só parecia. Erguia a cabeça como sempre o fez, mas somente para esconder a insegurança e o medo que predominavam dentro dela. Chorava. Chorava por causa do destino fatal que lhe foi dado, por causa da dor que sentia e por causa da força a qual as ondas batiam. Já não parecia possuir mais esperanças e logo o dia haveria de acabar, a noite chegaria e o fato de não mais ter ciência do que viria adiante, lhe aterrorizava. É um assombro ter de pensar no futuro estando naquela situação, pois que futuro há? Perguntava-se, sentindo que não havia escolhas; e conforme não sentia mais nada, aproximava-se ainda mais do mar.

Toda coragem que ela havia reunido para realizar aquele passo não significava mais do que um enorme medo de simplesmente viver. Viver e ter de sofrer com tudo isso que houve. E ter de lutar para se recuperar. E ter de conviver consigo mesma. E ter de encarar de frente as próximas boladas da vida que também poderiam vir. Mas apesar disso tudo, talvez a vida realmente continue e talvez ela não devesse desistir assim. Para tudo existem escolhas, depende do ponto de vista de quem as olha. Enquanto recuava, sabia que não escaparia da tristeza nem dos dissabores os quais viveu, mas de repente decidiu que iria encarar tudo isso. Em breve será passado, as cicatrizes sararão e só ficarão as marcas que podem sumir com o tempo, e tempo era tudo o que ela precisava no momento. Seguiria pela beirada do mar pois precisava andar, seguir adiante.

Sentiu o vento agora magicamente quente bater em seu rosto, como se enxugasse suas lágrimas. Olhou para o horizonte de uma maneira diferente. Entendeu tudo, mas não entendia nada, apenas esbojou um sorriso e olhou pro céu nebuloso e pros poucos raios de sol que iluminavam aquele local. Apenas retirou cuidadosamente o véu de sua cabeça enquanto caminhava e o lançou ao mar.

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Palavras da autora

Pense em todas as pessoas que cruzamos todos os dias aleatoriamente enquanto pretenciosamente tratamos de nossas vidas. Arrisque um número que os quantifique no final de apenas um dia e tente guardar seus rostos  por pelo menos uma semana. Tente os perceber ao seu lado e dê um palpite sobre a história de vida desses desconhecidos que estão sempre presentes. Sobre o que sente o senhor idoso com a cabeça recostada na janela do ônibus sentado ao seu lado. Os sonhos de vida da jovem a sua frente na fila do caixa do banco. Os remorsos daquela mãe andando do outro lado da calçada de mãos dadas com o seu filho. As poucas esperanças daquele homem sentado na esquina pedindo dinheiro. Olhe nos olhos dessas pessoas, figurantes de nosso dia a dia e atores principais de suas próprias histórias. Pense nelas e perceba em seus olhos o que estão dizendo, como se sentem e o que querem que seja feito por elas. Sentir que não estão despercebidos ainda que em meio a uma multidão passageira. Ter consciência do poder existencial que possuem, a beleza de suas vidas e histórias únicas. Histórias essas que nos renderiam milhões e milhões de livros totalmente inigualáveis.


Esse é o trabalho o qual eu gostaria de me dedicar a partir de agora. Transpor-me de mim e mostrar através de meus textos e fotografias todas essas pessoas anônimas as quais cruzamos ao acaso, suas existências únicas no mundo e potências de vida. Compartilhar suas histórias, o que são, o que foram e o que fazem na Terra. Quero conhecê-las, entender o que sentem, percebê-las, amá-las e principalmente: carregar um pouco delas comigo para onde eu for. Faço dessa, a minha maior e mais humilde missão!


"Como são admiráveis as pessoas que nós não conhecemos bem." Millôr Fernandes