sábado, 25 de dezembro de 2010

Aos que creem no amor

Se o Natal pudesse ser representado por apenas um filme, desses tantos que passam na tv nessa época do ano, este filme seria "Anjo de vidro". Ele reúne diferentes histórias de diferentes personagens, interligados entre si no dia de Natal (assim como a vida real). Alguns dos temas visivelmente tratados são: a solidão, o perdão, a confiança e acima de todos o amor. E esse último tema é algo fascinante e de natureza tão espontânea que atua quase feito mágica nessa época de Natal.

Uma das cenas mais marcantes, porém muito simples, é a cena na qual a personagem está no quarto de hospital, em visita a seu único familiar, sua mãe, que sofre do mal de Alzimer; e apesar de acordada, não reage a nenhum estímulo, estando sempre parada olhando para um ponto fixo o tempo todo. É noite de Natal e todos os familiares estão reunidos, ainda que nos quartos de hospitais. Porém, em frente ao quarto de sua mãe não há festas, nem pessoas, apenas um homem deitado aparentemente dormindo. Ele sempre esteve lá daquele mesmo jeito, nunca houve ninguém ao seu lado de todas as vezes em que a personagem ia visitar sua mãe. E aparecia também sozinho na noite de Natal.

Apesar do dia ser destinado à celebração, a personagem estava só e infeliz naquele momento. E pra completar, a única pessoa que ela possuía, nem sequer a reconhecia. Mas nada disso a impediu de se transpor em um pequeno ato de amor. Dado um momento, levantou-se de sua solidão, caminhou até o quarto à frente na qual aquele homem aparentemente dormia, tomou suas dores e do fundo de seu coração disse: "Eu te amo". Ela realmente o amava. Amava a sua necessidade de cuidados e necessidade de presença. Amava-o porque ele também é uma criatura de Deus e mesmo não acreditando Nele, amava o fato de que Ele ainda assim o amava. Amava-o porque ele simplesmente estava ali e ela simplesmente o amava.

Esse é o sentimento mais importante que existe: o amor. É preciso haver amor para que haja o perdão, a confiança, a verdade. Só o amor desconstrói a desavença e nos torna pessoas melhores.

Que neste Natal, o amor possa fluir cada vez mais espontaneamente de nós mesmos. Que ele possa invadir as famílias e todos os lares, resgatando o maior milagre já existente, a vida.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A festa

"As chances de eu conhecer alguém interessante hoje são mínimas" ela pensava enquanto observava a festa de longe, próxima a varanda do salão. Trajava um vestido longo de tecido fino, perfeitamente costurado cobrindo quase que totalmente o salto que lhe custou caro o suficiente para não ser mostrado naquela ocasião. Mas "caro" não era o problema, estava ainda coberta de acessórios em ouro. Seus longos cabelos estavam milimetricamente presos com a pura finalidade de ressaltar sua linda, jovem e melancólica face (e é claro, não ofuscar o brilho do par de brincos de ouro com detalhes em brilhante em suas orelhas). Estava elegante e impecável, porém, a importância de seu traje não lhe tirava a simplicidade de ser nem de ver as coisas. O local, igualmente importante e fino, também não a fazia mudar. Aliás, muito pelo contrário, aquele ambiente atuava como espelho para que ela pudesse enxergar a si própria verdadeiramente. E esse reflexo a fazia gostar um pouco mais de si mesma.

Apesar de ter algumas certezas consigo própria, nada mudava o fato de que, por algum motivo fatalista, ela estava ali naquele momento, zelando por manter sua essência e integridade, enquanto observava a festa de longe em sua solidão temporária. Não era a mais chic dentre as pessoas dali, mas atraia todos os olhares quando caminhava perdida por aquele enorme salão altamente montado para cenário de seus filmes. Parecia sempre querer se encontrar, ou ser salva, ou fugir. Imaginava-se saltando daquela janela rumo a algum lugar distante, na companhia de alguém que sinceramente lhe compreendesse e também estivesse alheio a tudo aquilo. Mas parecia não haver alheios.

A festa em sua sequência, consumia a todos imperdoavelmente. A iluminação inconstante estava dominada por um jogo de luzes piscantes, acompanhada de músicas eletrônicas dançantes que causavam quase que uma disritmia cerebral numa pessoa com o mínimo de sensibilidade sonora. As pessoas, possuídas pelo ambiente e pelo inconsciente jogo de poses, por vezes desfilavam intencionalmente pelo salão, bebendo e sorrindo enquanto se serviam daquela ração de gente fina. A mesma ração da qual ela também se alimentava e a fazia pensar.

Mas qual haveria de ser o preço pago por ela estar ali? Simplesmente estar, é a resposta. Pois não houve aquela companhia esperada que a salvaria daquele meio. Não houve nenhuma fuga cinematográfica em meio a chuva noturna, com direito a cabelos desfeitos, vestido molhado e brincos e anéis de ouro jogados ao chão da rua. Não houve nenhuma saída triunfal daquele evento, nem heróis, nem sorriso de vitória por experimentar o gosto da chuva frente ao gosto de fugir com quem for que a libertasse. Ninguém a libertou, nem ela própria o fez. Ela se limitou apenas às suas poucas certezas e vãs esperanças naquela varanda vazia, cercada do luxo sem valor daquela festa.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Breve suspiro da madrugada

Pensamos que seria para sempre!

Que ingenuidade a nossa achar que o tempo não tem seu pesar sobre nossos sentimentos, e consequentemente sobre nossas ações. Ou melhor ainda, que pretensão a nossa acreditar que este mundo infinito iria fazer parar tudo ao nosso redor, só porque nos sentíamos merecedores.

Tudo passa... e a questão não é achar que as coisas devem ser para sempre só porque tudo vai bem. Isso é egoísmo de nossa parte. A questão é que tudo se torna eterno o quanto tem de ser...

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Nada como... vizinhos!

          Dia desses, em uma tarde ensolarada e tranquila, estava eu a sair de casa com destino a um lugar qualquer quando a vizinha do prédio a frente chega até mim quase que atordoada, com um olhar de quem desesperadamente pede ajuda:
          - Meu namorado sumiu faz mais de 2 dias! Não atende o celular, não atende o telefone de casa e nem retorna ligação alguma! Eu não sei o que houve!!
          Por alguma razão que eu desconheço, a vizinha, em seu ato de desespero, veio a desabafar comigo naquele momento. Porém, qualquer coisa que eu falasse seria então a minha primeira palavra além de "Bom dia", "Boa tarde" ou "Boa noite" dirigida a essa moça quarentona, cabelos descoloridos, cigarro na mão e dona de um apartamento com vista privilegiada ao meu prédio.
          Tentei me situar por um momento, ignorar o fato de estar com um pouco de pressa e ajudar aquela pobre alma:
          - Mas vocês se falaram antes disso? Ele disse alguma coisa?
          Como se ela precisasse apenas de alguém para lhe dar atenção, aproveitou-se de meu aparente interesse em solucionar seu mistério e continuou:
          - Nós nos falamos na quarta a noite, ele disse que ia passar aqui de tarde para ver o negócio da minha moto mas não veio e nem ligou! Eu ligo pra lá e ele não atende, já deixei milhões de recados...
          - E você não tem o telefone de alguém que o conheça? (não vou nem perguntar sobre msn, orkut...)
          - Eu deveria ter o telefone do filho dele, aí eu poderia ligar - pensativa - e o telefone da venda ao lado da casa dele também. Eu poderia perguntar se eles o viram. Mas não sei o número!
          - E você não pode ir até lá?
          - É... eu estava pensando em ir amanhã se eu não conseguir falar com ele... Eu fico tão preocupada!
          Pobre vizinha, estava aflita. Já nem tinha mais unha pra roer, e só naquela conversa, já havia fumado uns 3 cigarros seguidos. Só Deus sabe o que haveria de ter acontecido ao seu namorado. Lembro-me de tê-lo visto algumas vezes de longe, mas só me lembro dele por causa de seu cabelo comprido e aparência hippie, que me chamaram atenção. Se eu bem deixar minha imaginação flutuar, consigo visualizá-lo sentado num barzinho bebendo cerveja e assistindo a jogos de futebol, sem noção do quanto está fazendo sua namorada sofrer. Homens!
          - Me desculpe por estar desabafando com você. Você deve estar com pressa para fazer as suas coisas!
          - Não não! Não tem problema, eu só gostaria de poder ajudar.
          - Muito obrigada! Você é uma boa menina!
          Sorri. Ela sorriu. Foi pra casa e eu fui para sei lá aonde sem importância.
          No dia seguinte, quis saber se já havia aparecido o tal namorado, mas estava com vergonha de tocar em seu apartamento. Sempre escolhi manter a minha privacidade e a dos outros, ainda que tivesse de passar por mal educada ou desinteressada certas vezes. Resolvi então, deixar de lado essa história e esperar por qualquer dia desses em que nos esbarrássemos na rua novamente.
          Alguns dias depois, estou eu me arrumando novamente para sair, quando chega minha mãe, super interada das últimas notícias do bairro e vem com essa:
          - Soube do namorado da loira da moto aqui da frente? ("loira da moto", nem sabia que este era seu apelido) Então, ele foi parar na delegacia por fumar maconha semi-nu numa praia lá pros lados de Guaratiba. A polícia ainda apreendeu uma enorme plantação de maconha dentro do apartamento dele para uso próprio.
          Fiquei boquiaberta com a história do namorado hippie da vizinha loira daqui de frente. Quer dizer... o cara plantava maconha dentro do apartamento e resolveu do nada sumir por alguns dias levando apenas umas roupas de baixo e muito fumo? E ainda deixa a namorada desesperada sem saber o que aconteceu. Tem cada gente doida no mundo... e o pior, mais perto do que a gente imagina!
          Deixei essa história toda de lado, é o melhor que eu faço. Terminei de me arrumar e saí. Quando estou andando, quem eu vejo adiante, caminhando em minha direção? A tal vizinha!
          - Boa tarde! - disse com um enorme sorriso.
          - Boa tarde! - respondi, passando direto sem muito alarde.
          É... o melhor que se tem a fazer mesmo é ficar só no "Bom dia" "Boa tarde" com quem não se conhece. Sabe-se lá quem são nossos vizinhos...

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Refugiemo-nos nos shoppings

Nestes dias incertos e inseguros, não é bom sair de casa. Lá fora quase sempre é escuro e triste. As pessoas não se arriscam a olhar nos olhos de quem lhes fala. Aliás, ninguém fala, somente uns poucos perdidos que ainda não compreenderam o esquema das ruas. E esse esquema é pra valer. É preciso estar atento, é preciso ser esperto. Ninguém vai dar uma trégua por você ser inexperiente ou sozinho. Todos estão sozinhos nessa. É preciso estar em alerta constantemente, ao contrário, a rua te devora.

Já que o problema todo é esse, não saiamos de casa! Ou melhor, saiamos, mas somente para irmos ao shopping. Melhor dizendo, refugiemo-nos nos shoppings! Lá tudo é agradável, iluminado, limpo, bem ambientado e... feliz. O esquema dos shoppings, no final das contas, é mais pesado do que o esquema da rua lá fora. Na verdade, não há muita diferença entre os dois, mas quem liga? Nada muda o fato de que a sensação que se tem, é que podemos realizar todos os nossos sonhos consumistas e limitados dentro daquele local igualmente limitado, propagado como um mundo a parte. E é um mundo aparte, mas para quê mesmo precisamos ter visão num mundo de satisfação aos sentidos? Ou vice versa?

Não há nada melhor do que sentir-se seguro. E esta segurança, os shoppings estão plenamente dispostos a fornecer aos seus clientes que passivamente aceitarem suas invisíveis imposições, disponibilizadas por seus modelos comportamentais (que não vêm ao caso agora). Aliás, nada disso vem ao caso. Percamos nossa visão, mas nunca nosso cartão de crédito. Não temos pra onde correr, se o tivemos um dia, desprezamos esta chance.

Mas afinal, quem liga? Shoppings são sempre tão tranquilos...


domingo, 14 de novembro de 2010

Cinza-escuro

Estou bem agora. A febre alta já passou e restou apenas um pouco de fraqueza como consequência. Só deparei-me comigo mesma do outro lado. E essa experiência não foi tão mal assim.

Tudo começou dia desses, quando eu acordei mais cedo. Muito cedo, por sinal, não havia nem sequer indícios de sol. Levantei, olhei ao meu redor e o silêncio daquela casa assombrava o meu interior profundamente. Todos ainda estavam dormindo e pareciam dormir para sempre.

Cheguei na janela, a rua ainda estava escura e silenciosa. Alguns postes acesos e um sinal pequeno de que em breve a manhã de um novo dia iria nos presentear com sua vinda. Vinda esta que iria me deixar profundamente doente. Mal sabia eu disso, antes tivesse continuado a dormir... a sonhar...

Mas estava sem sono. Inquieta. Com vontade de sair daquele quarto, deixar aquela casa. Sem porquê, sem razão, apenas vagar por aquelas ruas buscando encontrar algum motivo por sequer estar ali. E assim fui, de estômago vazio, mente vazia e mãos vazias.

Tranquei o portão do meu prédio. Olhei para um lado e para o outro. O caminhão de lixo não havia passado no dia anterior e o lixo que estava amontoado nos postes, havia sido remexido por catadores essa madrugada. Em resumo, minha rua estava uma sujeira. Mas ali não passavam carros. Caminhei até a rua principal, que é transversal a minha, onde pude vivenciar já da esquina um dos primeiros vestígios de presença humana. Um ônibus passou isoladamente e um carro, alguns minutos depois. Nenhuma loja ainda sequer aberta.

Foi nesse instante que me veio um arrepio apavorante. Olhei pra trás e não havia ninguém. Olhei pro céu e notei que o dia haveria de ser nublado. Olhei para mim mesma e me flagrei então, com medo. Medo de estar ali, sozinha àquela hora. Medo de deparar com o que eu realmente quero encontrar. Medo do que a vida me aprontou naquelas circunstâncias e até que ponto eu cheguei, meio que distraída, meio que seguindo os meus instintos. Medo de enxergar verdadeiramente as coisas.

E aquela manhã bem cedo parecia querer me mostrar muito! Ignorei meu medo e segui em frente.

O que a vida apronta de vez em quando?! Uma viagem inesperada? Um alguém inesperado? Só sei que parecia que eu não iria chegar a lugar algum.

Mas por incrível que pareça, cada vez mais que eu pisava aquele cimento, que ao mesmo momento passava um ônibus ou outro, um carro ou outro, cada vez mais o medo de estar ali fisicamente ia desaparecendo. Parecia que aquele céu, muito cinza para um começo de dia, ia fazendo mais sentido pelo simples ato de existir. O chão tão cinza e tão sujo sobre os meus pés também fazia sentido de existir ali em baixo. Em breve haveria de chover e depois da chuva, viria o sol e iluminaria toda aquela rua, e depois do sol, o chão haveria de secar e estar limpo novamente. E eu, que era apenas uma partícula atômica naquele monte de emaranhado de coisas que buscam um constante sentido para sua existência, haveria de voltar para casa e ver que todos já estão acordados.

E assim seria, se não fosse pela minha insistência e curiosidade de sempre querer ver o que há na próxima virada de rua. Continuei a caminhar naquele cenário perfeitamente montado para um estranho passeio matinal, considerado meio desagradável pelo senso comum. Já nem ligava pro fato de não ver ainda expressão facial sequer. Não havia pessoas na rua naquela manhã. Se era isso que eu buscava, teria de esperar um pouco mais. Mas já estava cansando. Queria voltar.

Parei no ar um segundo. Senti como se eu estivesse deixando aquele local, mas não da maneira convencional. Comecei a sentir meu corpo flutuar. Meus pés não pisavam mais aquele chão. Via a rua lá embaixo, bem pequena. Nenhuma árvore ao redor. Nenhum sinal de vida. Só cimento, e eu, voltando pra casa, pequena e quase que invisível vista daquela distância. Carregava comigo todo os conflitos da rua e ainda todos os olhares, expressões e sentimentos que eu não vi.

Mas nada mais importava, queria apenas chegar em casa e dizer a quem estiver interessado, que eu estou bem. Queria realmente estar bem, mas minha imunidade ficou baixa.

Assim que eu abri o portão do meu prédio, senti então todo o peso daquele passeio recair sobre o meu corpo todo. Foi quando eu fiquei doente. Entrei em casa e fui direto para a cama, nem pensei muito no que havia acabado de acontecer. Ainda era muito cedo e não era a hora de haver pessoas acordadas. Só eu, mas agora queria dormir.

Implorei naquele momento, uma trégua para o meu corpo. Pedi que cada célula permanecesse firme e não me deixasse adoecer. Mas era tarde demais.

A febre durou dois dias. Dois dias inteiros sem sequer sair a rua, independentemente de qualquer horário que fosse. O que sobrou, foi a lembrança daquele céu cinza e as sensações igualmente cinzas daquela estranha manhã, que hoje, pensando bem, se mistura a ficção.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Todas as estações

Meu sorriso de hoje não é mais o mesmo de janeiro. Os dias desde então não duraram menos que 24 horas, tão pouco mais que 100 dias. Fiz milhões e milhões de filmes e curtas, todos regidos por suas devidas trilhas sonoras. Vi filmes. Também deixei de ver filmes, os quais ainda me lembro até hoje.

Andei por infinitas ruas. Descobri novos caminhos e acabei por me acostumar a eles. Conheci pessoas, seres, carreguei pessoas comigo mesma. Não deixei elas irem. Não me deixei ir delas.

Quis muitas vezes fechar os olhos fortemente e deixar a correnteza me levar. Levar tudo. Quis simplesmente ir, nesse mundo de idas.

Chorei. E as lágrimas escorreram apagando o meu sorriso aos poucos. Um sorriso que hoje só existe na lembrança vaga de um verão quente do mês de janeiro.

domingo, 17 de outubro de 2010

621

          O ônibus sempre para nos pontos. A cada parada, diversos novos passageiros entram tomando lugar de outros que finalmente chegam a seus destinos. E nesse ir e vir, certas histórias e detalhes passam quase que imperceptíveis na rota até a última parada, que é o ponto final. Tudo isso é muito pequeno para sequer ser dado importância. Porém, demos importância e espaço somente agora.
          Era final de tarde. O sol dava indícios de que em breve iria se pôr, mas ainda estava em seu auge. Enquanto os raios se refletiam na janela do ônibus, meio vazio por sinal, uma moça bem jovem dormia sentada, cabeça apoiada ao vidro, boca entreaberta e... dormindo feito criança. Dormia com toda a sua força de vontade e nem sequer se incomodava com o balançar e freadas do ônibus. Vez ou outra, raramente, abria os olhos e espiava aonde havia lhe trazido o ônibus. Mas devia de estar muito longe ainda e como o sono falava mais alto, logo se punha a dormir novamente.
          Não muito longe do banco em que a moça estava, um pouco atrás, um olhar inquieto e atento  dava às honras de observar o que se sucedia ali a diante. Um rapaz de porte um tanto distinto, curiosamente observava a moça a dormir. Mas além desse singelo fato, parecia perder-se em pensamentos ao exercer aquele ato. Viajava na moça. E ela nem sequer estava presente, que dirá ciente de que estava sendo vista de longe.
          E o ônibus sempre seguindo em frente. Viadutos, pistas de mão única, um pouco de trânsito, sinais fechados, sinais abertos, placas de velocidade. Passava por favelas, prédios, casas, igrejas, infinitas ruas e diversas avenidas.
          O motorista, a trocadora, a meia dúzia de passageiros distribuídos pelo ônibus e as pessoas a passarem na rua. Todos como figurantes dessa história. A moça a dormir e o rapaz a admirar. O sol prestes a se pôr e toda a cidade como cenário. Dêem-me uma câmera, preciso filmar aquela cena do alto. Em breve vem a noite e nada durará para sempre.
          Ele sabia disso tudo. O rapaz sabia que aquele momento não iria durar muito e que em breve teria de saltar do ônibus. Sabia que em breve haveria de chegar ao seu destino desejado e mesmo sabendo que nada sabia da moça, teria de deixá-la em seu profundo e inocente sono. Sabia que aqueles poucos passageiros iniciais não eram mais os mesmos. Uns já haviam descido do ônibus, dando lugar a outras novas faces. O sol já havia sumido, restando apenas uma claridade que em breve daria lugar a escuridão. Os locais por onde o ônibus passava também não eram mais os mesmos. A única coisa totalmente imutável que sobrou foi a moça, que dormia calma, tranquila e profundamente.
          Histórias passadas em ônibus são realmente muito pequenas frente ao tamanho do universo. Os personagens são sempre muito simples para serem protagonistas de uma história sequer. Uma moça dormindo encostada numa janela de ônibus, um rapaz a observá-la. Mas um ato mudou tudo. E como desfecho, eis que ela se pôs a acordar e, dessa vez, definitivamente. Levantou apressada, ainda meio sonolenta, tocou a campanhia e desceu imediatamente do ônibus, em movimentos totalmente ritmados feito uma valsa ou passos de balé. Tudo isso acompanhado pelo olhar intenso do rapaz.

          O ônibus sempre para nos pontos.

sábado, 9 de outubro de 2010

Perdi meu texto a ser escrito

Perdi meu texto a ser escrito,
Em algum lugar dessa rua
Em algum rosto animado
Ou em alguma ave a voar.

Perdi meu texto a ser escrito
Em algum espaço de tempo
Suficientemente curto
Para carregar meus versos para longe.

E hoje me ponho a pensar
No texto que não escrevi
Que perdeu-se por aí...

sábado, 2 de outubro de 2010

Eleição suja

Rio de Janeiro, véspera de eleição 2010. Esta é uma pequena amostra do trabalho realizado no dia de hoje no meu curso de fotografia. Este material não possui qualquer intenção de propaganda política ou degradação de imagem de algum candidato. As fotos foram feitas aleatórias a este tipo de intenção.






segunda-feira, 27 de setembro de 2010

3 milhões de sensações

"Qual foi a melhor sensação que você já teve em toda a sua vida?"

Foram tantas as sensações aleatoriamente distribuídas por tantos anos vividos. Sensações de todos os tipos, feitas de todas as misturas possíveis de outras sensações. Sensações generalizadas que vão desde a felicidade até a sensação de tristeza, passando por outras variantes.  Sensações específicas e talvez marcantes como um certo primeiro dia de aula, um primeiro beijo com alguém especial ou até mesmo a sensação de vivenciar uma perda.

Sensações são tantas. Sensação de vazio que bate ás vezes por algum motivo talvez inconsciente. Sensação de isolamento, seguido por abandono e esquecimento. Sensação de medo, pavor mediante alguma situação ou perante a vida. Sensação de loucura, de viver a vida ao máximo, de "Carpe Diem". Sensação de anonimato, de ser mais um na multidão, de ser 1/3 de um grão de areia no universo.

Sensação de dever cumprido, de realizar uma boa ação. Sensação de cuidar de alguém e ser por alguém cuidado. Sensação de esclarecimento, de entendimento. De alegria pura e simples. Sensação de ouvir milhões de sons, de ver milhões de pessoas, de sentir milhões de sensações.

Sensação de acordar a cada dia e perceber nesse ato a esperança de um novo começo. Sensação de paz. Sensação de não estar só...

De todas as incontáveis sensações, qual pode ter sido a melhor? Todo dia é uma nova sensação, um novo sentimento, uma nova visão das coisas. Mas se um dia todas as sensações acabassem e só pudesse restar uma, a que perduraria seria o amor. Amar é a melhor sensação de todas e todas as outras milhões de sensações são variantes dessa eterna e benéfica sensação.

sábado, 18 de setembro de 2010

Uma só linguagem

Há uma só linguagem existente no mundo, que permite com que seus falantes sintam-se totalmente compreendidos e totalmente partes de uma só unidade.

sábado, 11 de setembro de 2010

O último telefonema

          Acabam de completar 12 horas desde o instante em que desliguei o telefone.
          Posso afirmar que não fiz muito durante esse longo espaço de tempo, apesar de cada segundo ter custado a passar. Minha única companhia que restou desde então foram as lembranças, e isto não era um consolo. Minha mente remoia cada pequeno detalhe, cada frase dita, cada suspirar e espaço entre palavras usadas naquela conversa. Construía e desconstruía cada segundo, cada instante. Sem parar.
          Não me resta muita fala agora, nem muito pensamento. O que me resta é uma certeza vaga  de que as coisas mudaram, os tempos são outros e que de um jeito ou de outro, devo me acostumar a isso daqui pra frente.
          Mas se a vida fosse um filme, a cena final seria o desligar daquele telefonema. E pronto! Teria sua beleza e encanto, ainda que fosse um final triste... ou feliz talvez, pois eu que estaria escrevendo o meu próprio roteiro. Mas a vida não segue roteiros, talvez essa seja sua beleza natural. A vida não termina num desligar de telefone, ela continua independentemente de qualquer telefonema, qualquer partir de coração, qualquer desejo incontrolável de eternizar uma cena ou de simplesmente terminar o filme. A vida continua, com seu arrastar de razões, de aprendizados...

          E agora, o telefone toca novamente...

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Distraídos venceremos!

          Sim, Paulo Leminski, distraídos venceremos! Mas para que o senhor escrevesse essa famosa frase que é também título de um livro de poesias, o senhor estava totalmente distraído? Ou se o estivesse completamente, como poderia ter percebido tal coisa?
          Não estou querendo colocar a prova a veracidade dessa frase internacionalmente conhecida não, muito pelo contrário! Pois afinal, sei bem e ainda por experiência própria que distraídos chegamos a algum lugar sim! Na verdade as maiores obras primas relacionadas a grandes nomes de artistas são produzidas distraidamente, como se fosse obra de uma mão divina materializada por eles. E muitas vezes é preciso estar distraído também para que se possa verdadeiramente ver.
          As vezes também é preciso estar distraído na vida pessoal para cruzar certas fases ou passar por certas situações momentâneas. Estar distraído é necessário para se atingir certas coisas na vida e até mesmo para simplesmente esperar... Mas o que eu quero dizer é que o maior segredo sobre o ato de estar distraído é justamente ter a percepção de o ser. Fica de resto uma certeza consoladora de estar sendo movido por uma força maior, sendo que a distração é apenas o reflexo da confiança que se tem em uma vida de plenitude.
          Paulo Leminski percebeu isso tudo e materializou nessa frase. Mesmo distraídos, aproveitamos todos os momentos da vida e ainda sem a preocupação com nomeação de sentimentos ou atitudes. Simplesmente vivemos... e para muitos, isso é o que basta!

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Conversas numa tarde qualquer

          Era um dia calmo e ensolarado. Estava eu sentada no portão do meu prédio que se situa numa rua pacata de um bairro qualquer do Rio de Janeiro, remoendo o fato de ter inúmeras coisas para fazer e ainda assim, estar ali sentada, meio que esperando alguma coisa, meio que vendo a vida passar... Mas como consolo do universo, eis que chega uma vizinha para compartilhar daquela solidão e iniciar uma conversa qualquer como era de seu costume. Eu que nada tinha em mente, nem mesmo iniciativa alguma de falar qualquer coisa que fosse, estava bem por estar ali, e agora com a companhia dessa vizinha que gostava de conversar e contar histórias (afinal, ela é mineira, o que justifica um pouco).
          Não demorou muito para que já estivéssemos a vontade sentadas ali naquele portão. A rua estava deserta, ninguém passava por ali e a conversa cada vez mais ganhava forças. Não me lembro muito bem sobre o que ela estava falando inicialmente, talvez algo sobre a faculdade, o que me lembrava que eu tinha uma pesquisa pra fazer. Foi quando então, começou a contar uma história tão bem detalhada que conseguiu me levar para um outro prisma. Começou assim:
          "O espaço de tempo da história que eu vou contar agora é muito curto. Na verdade, tudo se passa em segundos, numa questão de olhares cruzados. A situação é passada a nível psicológico, construída na base do diálogo puro, sem muita movimentação."
          Eu, que estava meio distraída, já prendi minha atenção na história. Ia imaginando conforme ela continuava a contar:
          "Muitas vezes, na rotina do nosso dia a dia, não compreendemos certas sensações ou ideias momentâneas que possamos ter. Nossa mente pode fazer mil viagens sem que nem sequer demos conta. Na realidade, o que queremos mesmo é um mundo de possibilidades, onde uma mente altamente criativa comande tudo.
          Enfim, a vida possui uma infinidade de possibilidades, com diversas combinações, comparadas aos números numa análise combinatória. Essa história fala mais ou menos disso.
          Em um lugar vazio e iluminado, ao redor da natureza, dois jovens se abraçam. Os dois parecem muito apaixonados. Conforme o diálogo começa, nós podemos deduzir que ele se encontram ocasionalmente e mesmo assim, não tem muito tempo para ficarem juntos. O diálogo apresenta um valor psicológico e conforme os dois conversam, fica evidente que eles só existem na imaginação de um dos dois. Este alguém, no caso, a menina, pode dar vida aquela situação inconscientemente, toda vez em que ela vê o menino. Eles não se conhecem ou não se falam, mas são apaixonados um pelo outro, sem saberem que vivem um lindo romance. É por isso que toda vez que ela passa por ele, sente algo que não consegue explicar. Mas no fundo no fundo, sem saber que pensa nele, acha impossível, aliás, nem cogita a possibilidade de os dois ficarem juntos realmente."
          Esperei por qualquer continuação que fosse, mas ela já havia passado o recado. Mais nada de tão marcante aconteceu naquela tarde, só no final algumas pessoas quaisquer que passaram apressadas em frente ao nosso prédio. Talvez para ilustrar aquela história...

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Eterno amor

          Todo final de relacionamento é a mesma coisa: lá se vai mais um eterno amor. É verdade, pois afinal em um relacionamento composto por duas pessoas há muitos fatores a serem considerados como: todos os momentos vividos, todas as promessas de um futuro juntos e os planos de vida; e até mesmo os momentos um tanto conflituosos, marcados por diferenças de visões da parte dos dois. Porém, por maiores que sejam os confitos, ninguém imagina que pode terminar um dia, que aquele amor que parecia ser eterno, poderia simplesmente ir embora de repente. Porque existiu algo entre os dois! Ou então todos os "eu te amo" não foram pra valer? E o que era eterno até ontem então, não é mais hoje?
          Pode parecer ingenuidade da minha parte fazer essas perguntas, mas eu sinceramente não consigo entender como é possível conviver com isso tão naturalmente. Mesmo que um relacionamento entre duas pessoas seja muito complexo e que seja preciso levar em consideração muitos fatores, não consigo entender porque o AMOR não pode superar tudo isso. Por que ele não pode superar todas aquelas manias que incomodam, por exemplo,  ou as diferenças de personalidade e modos de agir? O amor deveria apagar tudo isso a cada momento e deixar que fique apenas o melhor de cada um, permitindo que haja assim, confiança e sinceridade entre os dois.
          Gostaria de ser ingênua o suficiente para acreditar que o amor basta para eternizar um relacionamento. E usar desse argumento como consolo em caso contrário, se um relacionamento acabar. Pois já vi muito eterno amor indo embora, mas quem sou eu para dizer o que é eterno ou não?

          Eu? Provavelmente um eterno amor de alguém...


quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Sozinhos

Somos pessoas sozinhas, qualquer um sabe disso. Individuais e separados que se unem a uma outra partícula buscando suprir suas necessidades. Mas aqueles que sentem no fundo de suas almas uma chama viva e iluminada, possuem dentro de si, uma força e uma companhia maior do que qualquer outra. Estes sim, percebem o segredo da vida, ainda que... sozinhos!