sábado, 30 de julho de 2011

Mariana foi pro mar

Uma tarde fria, um céu cinza e um oceano inteiro de cenário. A praia vazia e úmida servia de abrigo para aquela pobre alma quase que jogada à areia, totalmente aos prantos. Trajava algo incomum para aquela ocasião, vestido branco bordado em pedras brilhantes, véu e grinalda; mais parecia haver recém saído do altar ao som de sinos e de promessas de felicidade eterna, do que qualquer outra coisa. Apesar de parecer uma noiva, não parecia estar feliz. Na verdade nem sequer era uma noiva. Enquanto remoía os fatos que sucederam sua chegada ao mar, chorava lágrimas de angústia, que misturavam-se à areia borrando sua maquiagem e apagando qualquer esperança de que poderia ser feliz novamente.

Casou-se há menos de 2 semanas com aquele que foi considerado o "homem de sua vida", e desde então parecia estar vivendo dias incríveis ao seu lado. Fez planos, construiu todos os seus sonhos em cima dos sonhos dele e estava pronta para abdicar de toda individualidade em prol da vida de casal. Sentia que sua bela história de amor começaria merecidamente a ser escrita, pondo fim a todos os seus dias de solidão e espera. Achava que felicidade maior não caberia em si daqueles dias em diante, e ao lembrar de tudo isso ali na areia, esforçava-se por pensar em todos os motivos possíveis que fizeram seu marido ir embora. Assim, do nada! Sem nem avisar nem se explicar, sem nem sequer preparar com antecedência seu frágil coração de moça pura. Acreditou nele, confiou todo seu amor e foi traída. Seu coração foi partido em mil pedaços, e como se não bastasse estar profundamente ferida interiormente, não possuía bem algum sequer. Todo o dinheiro que havia juntado faz tempos foi investido em seu casamento perfeito e ilusório, materializado em uma conta conjunta a qual foi varrida até o último centavo pelo marido ao partir. E ela, que já nem sequer iria querer mais nada dele mesmo, quis apenas ir pro mar, como último desejo talvez. Vestiu-se de noiva porque não queria ter de sofrer, ainda que nem por um instante conseguisse evitar. Foi pro mar porque a fazia recordar bons momentos do passado, quando ainda muito jovem passava horas sentada na praia imaginando como seria seu futuro ainda muito distante. Mal sabia ela naqueles tempos, que o mesmo mar que costumava fazê-la sentir esperança seria o mesmo que acabaria com o seu sofrimento no futuro. É isso. Ali, mirando o mar, teve a ideia de acabar com o seu sofrimento, mas da maneira mais fácil, porém mais covarde possível: tirando-lhe a própria vida lançando-se às águas como uma própria oferenda a tudo o que representa a imensidão e a tornava feito mais um grão de areia na praia. Estava fadada a esse destino, e já nem mais queria pensar nos porquês ou razões, queria apenas seu consolo fazendo parte do mar. E assim faria.

Alguns raios de sol alternavam-se entre a sombra das nuvens e iluminavam a praia, ela se ergueu na areia e fixamento olhando o mar, caminhou lentamente até ele. O vento mais parecia querer dançar, balançava seu longo e belo vestido branco, seus cabelos e seu véu, numa harmonia quase que perfeita. Sentindo o vento frio, tocou pela primeira vez a água do mar com a ponta dos pés, como se fossem os primeiros passos do fim oficial de seu casamento. Parecia tão decidida, como sempre fora em toda sua vida, mas só parecia. Erguia a cabeça como sempre o fez, mas somente para esconder a insegurança e o medo que predominavam dentro dela. Chorava. Chorava por causa do destino fatal que lhe foi dado, por causa da dor que sentia e por causa da força a qual as ondas batiam. Já não parecia possuir mais esperanças e logo o dia haveria de acabar, a noite chegaria e o fato de não mais ter ciência do que viria adiante, lhe aterrorizava. É um assombro ter de pensar no futuro estando naquela situação, pois que futuro há? Perguntava-se, sentindo que não havia escolhas; e conforme não sentia mais nada, aproximava-se ainda mais do mar.

Toda coragem que ela havia reunido para realizar aquele passo não significava mais do que um enorme medo de simplesmente viver. Viver e ter de sofrer com tudo isso que houve. E ter de lutar para se recuperar. E ter de conviver consigo mesma. E ter de encarar de frente as próximas boladas da vida que também poderiam vir. Mas apesar disso tudo, talvez a vida realmente continue e talvez ela não devesse desistir assim. Para tudo existem escolhas, depende do ponto de vista de quem as olha. Enquanto recuava, sabia que não escaparia da tristeza nem dos dissabores os quais viveu, mas de repente decidiu que iria encarar tudo isso. Em breve será passado, as cicatrizes sararão e só ficarão as marcas que podem sumir com o tempo, e tempo era tudo o que ela precisava no momento. Seguiria pela beirada do mar pois precisava andar, seguir adiante.

Sentiu o vento agora magicamente quente bater em seu rosto, como se enxugasse suas lágrimas. Olhou para o horizonte de uma maneira diferente. Entendeu tudo, mas não entendia nada, apenas esbojou um sorriso e olhou pro céu nebuloso e pros poucos raios de sol que iluminavam aquele local. Apenas retirou cuidadosamente o véu de sua cabeça enquanto caminhava e o lançou ao mar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário